quarta-feira, 28 de outubro de 2009

O Sonho e a Realidade

Não entendo a razão de após quase três anos de reforma ainda perder tempo a sonhar com o Banco. E sonhar não é a palavra correcta, leia-se em seu lugar pesadelo, pois nos meus devaneios nocturnos julgava encontrar-me ainda no activo. O mais grave era estar em falta ao trabalho há já um bom par de dias. Sorte ter um despertador que, pontualmente às sete horas, me acorda a mim e à minha mulher para a realidade…

Ainda ensonado mas já um pouco mais crente fui tratar dos animais da capoeira. De todos eles destaco a pata que, sem deixar o choco, me saudou alegremente. Já o seu companheiro foi mais comedido, manteve as distâncias, como convém. A um canto, numa pequena gaiola/ratoeira, um aparente e inofensivo ratito esperava pela minha misericórdia. Poupando-vos aos detalhes digo-vos apenas que nessa matéria sou firme e decidido.

Ao entrar na água da piscina, por certo bem mais quente do que aquela onde deixei o roedor, fiz as braçadas habituais que me revigoram e simultaneamente me deixam todo partido. Após este exercício seguiram-se a bica e leitura da ordem. Como o dia estava solarengo fui às Fontes (nascente do rio Lis) experimentar a nova máquina fotográfica. No regresso vi vários carros fazerem-me sinais de luzes, avisando-me que a polícia estava por perto. Não sei se foi bom senso, ou o facto de não trazer comigo os documentos do carro da minha mulher, ou levar quatro recipientes com gasolina aditivada para a motoenxada, ou serem já quase horas de almoço, o certo é que decidi fazer meia-volta e rumar ao Canário em busca de alimento.

Polvo na brasa bem regado (com azeite) acompanhado de batata a murro (prefiro-as já descascadas), alho, coentros e o imprescindível vinho branco fresquinho, mais broa e azeitonas à mistura foram a minha companhia e distracção, até que um casal, a rondar os setenta, chegou e se sentou noutra mesa. Ele, de frente para mim, vítima de possível AVC, com olhos tristes e chorosos e ela, com toda a ternura que é possível, a preparar-lhe o prato perante os seus indecifráveis balbucios. Eu, que praticamente já tinha devorado o pudim caseiro, ao ouvi-la dizer com certa mágoa e resignação - “desculpa, não consigo entender”, senti como que um amargo de boca...

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Máscaras

A semana passada fui ver, no Banco de Portugal em Leiria, uma exposição de Máscaras da Ásia da colecção Museu do Oriente. Nesse antigo edifício de Ernesto Korrodi onde, sob fortes medidas de segurança, se levantava e depositava numerário e efectuava a compensação entre Bancos, dei comigo a recordar nostalgicamente os meus próprios passos…

Apesar de hoje o vil metal já não circular entre as suas paredes e a segurança não ser a de outrora, mesmo assim, fui impedido de levar comigo a câmara fotográfica, situação aceitável e compreensível (que remédio).

Não podendo deixar aqui uma imagem sobre a exposição, e, sabendo de antemão que esta valeria mais que qualquer palavra digo-vos apenas que as máscaras, sejam elas quais forem, mostram muito e revelam ainda mais do que ocultam ou pretendem esconder.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Do Tudo e do Nada

Um vulcão ainda que adormecido não deixa de ser um vulcão, mesmo que a sua lava não se veja, não se iludam, ela está lá prestes a jorrar.

A Natureza e o Homem são imprevisíveis. Capazes do melhor e do seu oposto, num ziguezague constante em busca do equilíbrio, difícil, que se pretende perfeito.

E vem isto a propósito de quê? Do tudo e do nada.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

BUCÓLICA (Miguel Torga)

Em Junho de 1947, precisamente um decénio antes do meu nascimento, Miguel Torga escrevia em Coimbra estes versos que eu viria a conhecer muitos anos depois.

BUCÓLICA

A tarde, doce como um fruto, cai,
De madura, no chão.
Venha alguém apanhar a Vida!
Ou já não há quem saiba desejar
A maçã proibida?


Os livros, como os homens, fechados pouco revelam. Abri-los sem pressa, folheá-los, ler-lhes a alma e desvendar o que ocultam não está ao alcance de todos, como a poesia. Antes de a tentar entender é necessário senti-la.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Caim / José Saramago

É a primeira vez que compro um livro e o leio no mesmo dia do seu lançamento.A história dos homens é a história dos seus desentendimentos com deus, nem ele nos entende a nós, nem nós o entendemos a ele”.

A idade não lhe turvou as ideias, pelo contrário, acentuou-lhe convicções, e, as reacções ao seu novo livro não se fizeram esperar.

Se, “as águas paradas não movem moinhos”, criam lodo e mosquitos, então prefiro as revoltas mesmo sabendo que sou dado a enjoos.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

As velas ardem até ao fim

Fui, desde sempre, e sou ainda um tremendo egoísta. Nunca gostei de emprestar nada a ninguém, principalmente discos ou livros, na volta já não eram os mesmos. Reconhecer que sou assim será já um princípio para a cura? Creio que não. Mas nem todos pensam como eu, e ainda bem. Os últimos três livros que tive o privilégio de ler foram emprestados à minha mulher (*). Como sou casado em comunhão de adquiridos, achei-me no direito de lhes pegar. Sim, posso ser um egoísta assumido mas não sou parvo.

A “vítima” desta vez foi o romance – “As velas ardem até ao fim”. Esta obra, de Sándor Márai, “é um verdadeiro tratado de psicanálise e uma importante reflexão sociológica”, onde a obsessão pela Verdade permanece até ao fim. É um daqueles livros que considero imperdíveis.

Pelo pouco que disse e muito que omiti resta-me agradecer à Amiga Guidinha. Obrigado!


(*) Eterno coração de manteiga, com pouco sal e gordura mas rico em sentimentos, lá os vai emprestando por ela e por mim…